A maravilhosa sala do cineteatro São Luiz.
.Hall de entrada com mármore de Carrara e lustres de cristal Tcheco.
Fachada do cinema na praça do Ferreira, Centro de Fortaleza.
Publicado originalmente no site da Revista Ideias, em 12 de agosto de 2016.
O fértil Cine São Luiz.
Por José Augusto Jensen.
Luiz Severiano Ribeiro foi o maior exibidor brasileiro na
época dourada do cinema, ou seja, os anos 1930, 1940 e 1950. Cobria o norte,
nordeste e a capital federal, na época, o Rio de Janeiro. Seu filho e seguidor,
Ribeiro Júnior, entrou na sociedade da Atlântida, produzindo filmes,
distribuindo-os e criando um laboratório de processamento e revelação. Fechava
o ciclo do que se chamaria de indústria cinematográfica brasileira e
configurava, segundo a crítica da época, um grande monopólio. Criariam o maior
fenômeno das telas brasileiras: as chanchadas da Atlântida.
Os números impressionam. “O homem do Sputnik”, de 1959,
dirigido por Carlos Manga, foi assistido por 15 milhões de pessoas, quando a
população brasileira era de 60 milhões. Poderia citar muitos outros sucessos,
além dos cinejornais semanais e documentários produzidos. Apesar de inúmeros
cinemas enormes e de alto luxo, Severiano Ribeiro resolveu presentear a cidade
em que se firmou como empresário, Fortaleza, recomendando aos arquitetos e
projetistas: “Quero em minha terra o cinema mais luxuoso do Brasil e não apenas
do Ceará”. A construção levou vinte anos, pois tinha como principal obstáculo
as precariedades da segunda guerra mundial, com grande parte do material usado
importado, como mármores de Carrara, pisos e esquadrias, lustres da
Tchecoslováquia, equipamentos de ar-condicionado e o melhor para a projeção e
som. Foi inaugurado em 26 de março de 1958 com o filme “Anastácia, a princesa
esquecida” (Anastacia), com Ingrid Bergman, Yul Brynner, direção de Anatole
Litvak, produção Fox de 1956.
Com a deterioração do centro da cidade e a proliferação das
pequenas salas nos shoppings, o espaço acabou sofrendo e fechou, apesar de
tombado em 1991. Em 2007, a empresa entrou em acordo com o SESC, mas com os
equipamentos desatualizados e precários, acabou não dando certo. Em 2009, a
Igreja Universal ofereceu à empresa Severiano Ribeiro R$ 1 milhão pelo cinema e
prédio. Houve mobilizações de setores cearenses, e o grupo Severiano Ribeiro,
no intuito de preservar o imóvel e sua finalidade cultural, vendeu-o ao Estado
do Ceará por 3 milhões de reais. O grupo continua atuante em shoppings, no formato
multiplex stadium, apesar da entrada agressiva no mercado das empresas
estrangeiras.
Após dois anos de reformas e a um custo de 17 milhões de
reais, reabriu como Cineteatro, em 22 de dezembro de 2014. Foi equipado com
tela móvel de exibição, caixa cênica reestruturada, camarins, fosso da
orquestra, equipamentos de sonorização e iluminação para teatro, dança e
música. O projetor digital instalado para cinema é da empresa Barco de 2k e a
sonorização para filmes Dolby 7.1, com caixas JBL. Com acessibilidade para
deficientes e mais espaço entre as poltronas, o número de lugares ficou com um
pouco mais de mil poltronas. O edifício acima do cinema abriga a Secretaria de
Cultura e da Ciência e Tecnologia. Espaço magnífico, cumpre importante função
cultural na vida de Fortaleza e é peça importante na revalorização do centro da
cidade.
Além de abrigar o Cine Ceará, Festival Ibero-americano de
Cinema e outras mostras, o cineteatro tem extensa programação regular, como
Clássicos São Luiz, com filmes de Fellini, Bergman e outros, tem ênfase em
produções brasileiras, europeias, enfim as chamadas alternativas. Na função de
programador, Duarte Dias tem dificuldades com as distribuidoras devido ao baixo
preço dos ingressos: R$ 6,00 a inteira e R$ 3,00 a meia, dificultando a
negociação com as produções desejadas, apesar do número de poltronas.
Julho teve extensa programação de filmes infantis, além das
sessões especiais para alunos de escolas públicas durante o ano letivo. Tudo
visando à formação de público, que como escreveu a Adriana Sydor, em artigo
desta revista: “Uma política pública de cultura séria não tem editais de
financiamento de projetos até de capitalização de artistas como ponto central
de seu texto. Política pública de cultura tem que envolver formação de plateia,
educação, informação, conhecimento. Tem que se relacionar mais com a população
do que com os artistas.”
Imagine, Adriana, eu estava no cineteatro São Luiz em 26 de
junho, um domingo, e fui ao que eles chamam de sessão sonora com início às 16
horas. Começou com a exibição do documentário “O homem que engarrafava nuvens”,
contando a trajetória do compositor cearense Humberto Teixeira, que fez dupla e
ficou à sombra do mais conhecido Luiz Gonzaga. Produzido pela filha Denise
Dumont, conta com a participação de diversos cantores, depoimentos e gravações
em arquivo. Dirigido por Lírio Ferreira, tem duração de 100 minutos, projeção e
som da mais alta qualidade. Após, Denise foi entrevistada e anunciou a doação
do acervo da família ao Museu da Imagem e do Som do Ceará. Então a enorme tela
subiu e, no palco, um show abrangendo músicas de Humberto Teixeira com um grupo
da cidade. Foi muito emocionante vermos no documentário imagens do interior do
estado e seus cantadores. Preço do extenso programa: R$ 20,00 a inteira e R$
10,00 a meia.
A secretaria ainda mantém o Centro Cultural Dragão do Mar,
na praia de Iracema, enorme espaço para exposições e mais duas salas de cinema,
cafés, lojas, restaurantes e o planetário.
Algo parecido aconteceu com o Cine São Luiz em Recife,
também mantido pelo Estado de Pernambuco, apresentando extensa programação de
filmes, com ênfase no cinema nacional.
Voltando à terrinha, ainda ouço a notícia de que o governo
do Estado do Paraná quer vender, por motivos inconfessáveis, o único espaço que
restou dos cinemas da capital, o Cineteatro Vitória, transformado num pequeno e
mixuruca centro de convenções, alegando que é deficitário. Realmente, a
pequenez cultural e mental da qual dependemos neste governo nos torna mendigos
à espera de eventos ou simples filmes não comerciais, que não encontram espaço
nesta combalida Curitiba. Vergonhoso. Já que o imóvel pertence ao Estado, já
estaríamos com mais de meio caminho andado para a transformação do espaço. Ou
não merecemos nem uma pequena parte do que os cearenses, pernambucanos e outros
cidadãos brasileiros desfrutam?
Texto e imagens reproduzidos do site: revistaideias.com.br
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